domingo, 21 de dezembro de 2008

Soneto do Esquecimento

Debaixo da pedra o verme desdenha
A sorte da carne que já fôra gente
Agora adubo, esterco, semente
Todo orgulho e arrogância ferrenha

E no peito nem saudade ou tristeza
Aparece naquela tarde cinzenta
Onde a ditadura da frieza
Sufoca aquela dor cruenta

E nos lábios secos de cor parva
O silêncio apenas povoa e
Belas canções de vácuo entoam

Os que antes amores contentes cantavam
Hoje sem nenhum sopro de ressentimento
Apagam-se nos umbrais gélidos do esquecimento

quarta-feira, 22 de outubro de 2008

Eu

“Ao poeta augusto dos Anjos”

Eu, Eu, Eu

Transcendente e abjeto

Polífono, acústico e sintético

Eu perifrástico e ignoto

Roto, escroto

Eu transistor e mentecapto

Absinto, abstrato

Eu simplesmente eu

“Yo non tengo la plata”

Eu circunspecto, incircunciso

Real, aéreo, indeciso

Eu cerne do universo

Tutano do mundo

Tristereza, marimbundo

Agora e depois

I am ...

Mictorium

Latrinário

Vislumbrorium

Divisado

Eu ...

Transnordestino

Metropolitano

Brejeiro

Tranqüilo, paciente e arengueiro

Eu simplesmente

Nexo, entre o côncavo e o convexo

Entre o que calo

A porrada e o estalo

Sinto-me apenas sendo

Eu...

Passando ...

Escrevivendo ...

sexta-feira, 17 de outubro de 2008

Madrugadas


Tínhamos assuntos infindáveis

Noite a fora, copos de vinhos sobre as mesas

Ou apenas a friagem e o orvalho da noite
Somos irmãos de umbigo pelo universo

E de verso somos primos terceiros
Fora a distância, os pés cansados

Os bolsos sempre secando
e a saudade incansável,
Nossa amizade prevalece

As palavras reproduziam textos

Os textos sentimentos, atos e abraços

Com sabor de irmandade calorosa

Noite a fora íamos descontruindo a madrugada

Que torcíamos para que esta não se fosse

E agora como estamos?

Se o diálogo interrompido pela roda viva,

Pelos gametas, tradições de correntes e coleiras

Se processa, agora, apenas telepaticamente no infinito

Mas um dia quando a maturidade apontar

E nossas rugas escreverem a verdade aos nossos olhos

Veremos escritos no livro da eternidade

Que o que importa nesta vida

É o que menos se dá importância

Voltaremos, então, ao ciclo de transcendência mútua

Nutrida vorazmente pela reciprocidade de nosso verbo.

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

O beco

São três sóis, são três luas
O universo ardiloso do teu ventre
Nesse abismo sedutor
dos teus braços.

Verde que te quero verde
De esperança nos olhos
E açucar no teu umbigo

Fui ao canto do beco
E lá estavas de cócoras
Apagando com urina
O submundo do desejo
Em chamas.

E eu com minha lingua ingênua
Me perdi no teu útero
Mas, no final dos tempos
Só restaram meus passos
Caminhando desnudos

E meus lábios mudos
Tremendo na gélida manhã
de domingo.

E nesse desencantamento todo
Eu vi um arco-íris no horizonte
Naquele instante pensei
Com minha sombra abobalhada
Que no fim da ponte multicolorida
Estava lá meu coração semi-devorado.

sábado, 2 de agosto de 2008

Desobediência Civil 2

O que te serve nesta noite ?
Em que o frio te lambe os ossos
E teu coração mais parece
Um rio em silêncio.
Tu te sentas, olha pro chão de teu peito
E encontras ali uma pequena fogueira
Acendes, sopras, te cansas
Mas o fogo não tem ânimo pra desabrochar no mundo.

Olhas em volta e ninguém te conheces
Logo tu que a cada passo distribuías acenos
Agora é só você nesta estrada
Feita de chão e estrelas congeladas
Agora é só teu medo que vivia preso e agora fala mais alto
Neste exato momento é só você
De frente com a tua angústia eterna

É só este ser contido
Que se encolhe a cada segundo
Até tentar desaparecer por completo
Mas nem isso consegues,
Pois tua teimosia vai inflando, inflando
Lentamente nos anos que se arrastam
Pelas calçadas das ruas desconhecidas.

Até que um dia ela se torna insustentável
E explode em raios iluminados de força e sagacidade inexplicáveis
É exatamente neste dia
Que estarás realizando a missão iluminada
Da tua vida antes sem sentido.

sábado, 12 de julho de 2008

Manifesto Sopofágico

No silêncio da mesmice da mata
Vazia, escura e esculhambada
Urge de uma caldeira escandalosa
De textura venenosa e cítrica
A sopa podre feita de angústias
E vísceras humanas


Para diarréia cerebral
O laxante cósmico
Para que se evacue
Toda a estupidez
Da gente provinciana

Elogio ao cão sem dono.

No seu olhar sereno,
Cintila o brilho da liberdade
Esculpida a chutes,
a pedradas e maledicências.

O cão sem dono,
Andarilho renitente,
Transgressor dos açougues,
A fome, a fome, a fome.

O cão sem dono uiva na frieza da noite,
Expluindo em angústias
No agouro da morte,
A felicidade de ser livre
E o dilema da liberdade.

Poema para matar a saudade

Ó minha terra me esperas de longe
Mas um dia retorno cavalgando saudades
E volto com todo amor recheado de brilho
Esborrando o olhar de felicidade

E se me recebes com meus amigos sorrindo
Eu me transbordo de alegria
Se encurtam as noites e os dias
Com esse pensamento sempre surgindo

E eu de cá sempre erro o caminho
Que transcorro sem parar um momento
Mas recupero o movimento
E torno a te encontrar

Nos meus sonhos e desejos que disperto
Fico eu te reencontrando
Vivendo as horas mas não esquecendo
O que disse do meu retorno certo

Lua Partida ou Partida da Lua

Eis que a linda lua foi embora
Com sua energia negra sobre o teto da casa
Que desabava sobre os abismos abertos sobre o chão de medo

Mas que ela fosse embora
Mas não levasse consigo todo encanto da noite
Todos os meus versos debaixo do braço
E entranhados na sua pele

Minha palavra hoje muda
Meus cânticos de silêncio
Pernoitam agora sem ritmo
Sem o embalo dos teus seios de pedra
E das tuas coxas de labaredas

E que ela fosse embora
Mas não se irrompessem tempestades
Que inundassem de frio os meus braços destruídos

Hoje apenas passo e olho
Como se não fosse nada o que nada foi de fato
Com o olhar liso de parede ela me despe,
Me violenta e humilha num sorriso
Cravando com seus dentes de navalha
O pobre cerne de minha alma dilacerada.

Alçapão

Quando os meus olhos distraídos contemplaram sua beleza
Ferveram-se meus ossos e minha boca salivou desejos
Eis que me aproximo e percebo sua pobre alma ansiosa
Mistura de tempestades de angústias e trovões de medo

E não posso, não quero e nem minto
Que o que sinto só pode ser instinto
Apenas carne que se roçava em minha pele
Com sua cor de sol e um sabor de gilete

Eis que nem mais olho pra não furar minha íris
Em seus espinhos que escondes nas pétalas do seu rosto
E nem a toco mais no meu sono

Pois durmo agora de olhos ligados
Pra não me perder entre os seus descaminhos
E não me achar no seu ventre armado

Fetiche

Nó na língua
Laço molhado no ouvido
Caminhada sedenta de meu nariz em tua pele

Esse desejo de amarrar teus braços
Nas estrelas.

Agradecido

O olhar de cima a baixo
Como quem diminui
Em tom magnético
O que é grande e belo

A atração impossível,
O segredo que aflora
Desejo, instinto.
A vontade inconfessa

Mas há a hora em noite de febre
De beijar o prato cuspido
Em língua de perdão

Nos lábios do morto gélido
Ressurreição do calor vermelho
Pulso do universo sincero.

Manifesto dos Sem Palco

O sem-palco é o pior dos sem-nada
São os sem sonhos, os sem luz,
Tal qual o cantor sem garganta,
O poeta sem tinteiro.

O palco é um banheiro
De onde se canaliza a limpeza diária
Da mente, do riso, da máscara cotidiana.
O sem-palco é o reflexo fiel
Da cultura capitalizada.

Onde o lucro rouba a audiência,
Onde a burrice é a inocência conservada
Mantendo a ignorância bem comportada.
Os sem palco são primos dos sem-gravadora
E primos terceiros dos sem-livro.
E, perambular todos na mesma BR do
Anonimato e lutam todos juntos
Apesar dos seu s orgulhos inatos
Os sem-palco no seu sonhar se esquece
De que palco não é só o que falta.

Mas, lembra que a arte é o ópio que
Não deixa a consciência na ribalta
Educando-se aprende a contentar-se
Com a realidade deturpada ou
A tentar converter a injustiça instalada.
Os sem-palco, mesmo com palco,
Não se esquecerá de cultivar todas as
Mentes férteis de todo de qualquer
Espaço físico.

Todos os sensíveis sabem que é
Urgentemente preciso uma
Reforma Palcária.
É a necessidade maior, a demanda lúdica
De todos os meros bobos da corte.

Dois Pontos

Há entre os dois pontos
Que me invento
Tudo que de fato
Existe de intangível

O fogo úmido molhando
Os olhos secos da
Flor nascente
O colírio do incrível

O que crio
Roubo do firmamento
A cor a tingir
O sonho neutro
O mar do amor
No qual me afogo
Tecem, tocam
As mãos de vento

Há entre os dois pontos
Que me invento
A rima, a soma,
O rio, o riso
Guardados, amadurecendo
Há entre os dois pontos
Que me invento
Até o saber da lua e o poder dos ventos

A explosão da vida
E o silencio do silencio
Tudo isso há entre os dois pontos que me invento

A imagem de meu amor frustrado


A imagem de meu amor frustrado
É bola de fogo em céu de prata
É luz néon rasgando azul
Rubi de cera em noite escura.

Ela foge de mim
Como imã de imã
Em carga mesma
Entrando no meu peito
Feito bicho de pé

O que existe
É carvão de gelo
Poeira parada
Simplesmente
Nada com nada

quinta-feira, 5 de junho de 2008

Tziu

E num susto se escuta

logo em cima do fio
Um negrinho astuto

Falando Tzzziu!


E no ato despeja

Sem medo seu brio

Pulando no ar,

Diz um Tzzziu !


Se encanta o menino

Vendo o desafio

Seu riso se abre

Num desvario



Dá voltas no tempo

Na beira do rio

Rasgando o silêncio

O negro Tziu.



O furor da vida

Com todo o seu cio

Numa manhã de domingo

A vida se abriu


Nos saltos e giros

do moleque tziu

Minha vida faz voltas

Coração a mil.


Se escuta de longe

Com a tarde caiu

A estagnação do limbo

Se escuta: Tziu!!!



quinta-feira, 17 de abril de 2008

Paixão, como se usa?

Não sei usar a paixão
Pedra de fogo riscando o céu
Carrossel de impulsos
E veredas desconhecidas
Às vezes, acelera meu peito
Inflamando com doçura
Cortando com a língua cruenta
Sua frágil textura de cor e dor

Às vezes congela meu ânimo
Picolé de chuchu
Tédio de domingo
E busco abrigo
Chorando ao luar

A paixão é assim
Nasce do nada
Quando vê estou na escada
E rolo até o fim

E me fodo e me flagelo
Atropelo a língua
Corto os pulsos, bebo água sanitária.
Pra alvejar a penumbra da rejeição.

É lasca, a paixão.
Às vezes gosto tanto
Que derretido em prantos
Engasgo-me com o doce sumo
Do fel que escorre da linda boca
Que diz “não” aos olhos secos
Arreganhados de paixão

A menina que virou palavras

E se esvai em frases
De paranóia circulante
De circuito fechado
A verborragia elétrica
Sem nexo
A meia vida
De uma ninfeta esquizofrênica.

E se volatiliza na fala
A donzela antes muda
Um maremoto
De paixão reprimida

Em carne viva
Sua língua arde e cintila
Os ouvidos engatilhados
Dos olhares atraídos
Pela candura febril
A menina que virou palavras
Pronunciando em sintaxe de raios
Sua alma agora irrompia
Em três mil megatons de
Letras em choque.

Réquiem para uma cidade entre o caos e o desejo

Sou um palhaço sem futuro
Tropeçando pelos becos
Dos prostíbulos encharcados
Se descascando sob a chuva
De facas, fel e foices
No submundo dos excluídos
Em meio ao bombardeio da ganância

Contra mim latem os cachorros
Com quem disputo o meu almoço.
Entre mendigos, cheira-colas,
Prostitutas e bandidos,
Eu degusto o que nos sobra dos banquetes dos poderosos.

De onde vem o meu sorriso?
Da mais profunda ironia no enxergar dos absurdos.
Ai meu Recife, quantos medos e desejos de ti eu construí.

Entre a surpresa da altura imponente dos arranha-céus e
O sofrimento absurdo
Dos manguezais soterrados.

Meu sorriso vem da força pura da marginália em movimento.
Entre o desejo lancinante da utopia e a fria realidade.
Do meu sarcasmo de saber que as vitrines
São limites entre dois mundos.
O dos que querem
E o dos que podem.

Ai, ai Recife, picadeiro em chamas,
Ensaio um novo sorriso entre os escombros.

Lar



Seja a luz de um novo sonho

Liberto entre flores

O aroma de paz e brisa

Verdejando pelos olhos

Regado ao som do sol

Azulando no horizonte, amor

Entre os fios de ouro

O nosso ninho de céu

quinta-feira, 27 de março de 2008

Coragem

Desafio meu corpo contra as palavras
E me enfrento todos os dias no espelho
Olho nos meus olhos e escrevo
Na tela dos sonhos, os desejos.

E sem medo suporto as agruras
Da dor, do tempo e da saudade
Pois uso a arma mais potente
A centelha febril da verdade

Que escorre dos meus olhos
E no texto descobre o colorido
Forte das palavras, e te digo:
Com a lança do meu verso emperdenido
Já matei sete feras e um camelo
Perambulando a noite dos meus pesadelos.

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2008

Espera

Como quem espera a queda de cometas
Espero tua chegada ao meu mundo
Raio de orgulho partido
Olhar seco na neblina

Os segundos escorrem
Do firmamento
E minha garganta
Profere gritos silenciosos
E tu não chegas

Rezo, canto e praguejo
À paixão de areia que desmorona
Sobre minhas células ressentidas

Nunca mais ficarei ao relento
Suspirando a flor venenosa
Por três mil anos fui ferido
Com a lança doce do desejo

ARDIL

“De início quero ser navalha do próprio pescoço”
Aquecendo com o sangue o marasmo do tédio
Na noite insone e sem lua
Degustar
O desespero do vazio
Na certeza matemática
Da morte
E na efemeridade insignificante
Da vida

Quero ser poema
Sibilado no ouvido
Na hora do orgasmo
E do suplício de morte

Quero ser ágil
E com olhar ampliado
Senti a malícia salivando
Na boca sedenta das raposas
E ardilosamente
Planejar
O beijo assassino

Eu pirulito

A sensação de ser folha
De papel rosado
De um diário de menina
Com o coração zangado
A de ser pirulito de açúcar
Chupado, babado e fora jogado.

A de ser tapeado
Usado como virtual
Substituto
Para um namorico em crise.

Era de se imaginar
Aqueles beijos estalados
Que pareciam ensaiados
Aquele amasso dado em claro
(pra que todos vissem)

E eu bobo
Eu pirulito,
Indo no embalo.

Respondendo com beijo
O beijo dado,
Gostando, dançando
Abraçando empolgado
Já excitado.


Era cada beijo
Cada fungado
Eu pirulito
Chupado

Doce na essência
Coração melado
Também me exibindo
Também rebolado
Fingindo enganar
Quando enganado.

Hoje sem gosto,
Meio azedado,
Peito formigando,
Palito quebrado
Cônscio do uso
Sabendo-se usado.
Eu pirulito
Já descascado
A procurar outra boca
Que me queira lavado.

Súplica no morro

O olhar do morro nos enxergando
Como quem suplica e questiona
A dor de um menino que se menciona
Morreu de fome e chorando

Sua mãe solta um grito derramando
Toda angústia que aprisiona
Num eco vazio que não funciona
E o silêncio continua pairando

Mas há de um dia o universo
Convergir para um só processo
De igualdade e justiça de fato

Chega de leis sem cumprimento
Chega de lar sem alimento
E muita fartura em cada prato.

Setor de Frios

Meu coração peixe exposto na prateleira
Perecível e vulnerável, brinquedo perdido
No meio da rua
Sem preço, destino incerto no fim da festa
Feira de signos e maldições prediletas

Fica abandonado como quem espera
O que não há de vir
Iludido com as falsas faíscas
Resvaladas por engano nos olhos empoeirados
Secos pelo açoite cruel das horas impiedosas

Seguindo sombras de gaivotas negras
Sobre a água do rio poluído
O tempo passa cantando
E com o sangue acidificado
Passa na garganta o desejo resfriado
Pronto pra nascer novamente entre a lama
De areia movediça e a lava de um vulcão extinto

Sem saber que ele mesmo
É o prego e o dedo
Que reclama distraído
A felicidade sonhada que não enxerga

Eu e Guarabira

A nova cidade está aí disposta.
Desenrolada na estrada sóbria do porvir,
Indicando nova vida pra viver
E ser assim como que por acaso.

A vida está aí na frente
Com tudo que ela tem direito,
Com o vento e com as montanhas que te afagam de longe
E repercute no peito o arrepio.

Guarabira me recebe com o seu sorriso
E deseja que eu me transforme no que sou,
No homem que me sonhei quando menino

A vida me sorriu e o que eu posso é alegrar-me
E a cada dia sorrir com o presente
Do olhar do sol no horizonte.

A cidade está aí de frente,
Esperando-me,
Pra que eu cresças e mereça o que é meu.
Pra que eu floresça entre as flores secas e talentosas.

E cante no verso de cada estrada
Minha alegria mais sincera e estrondosa.
E escreva nas nuvens poemas curtos
E longas estórias de amores impossíveis.

E me realize com graça e rebeldia,
E não pare nunca de crescer e querer ser.
Ter beleza, saúde, riqueza e cultura.

Tudo se encaminha
Na altura de onde eu queira estar
Basta deixar ela me beijar
E que o resto depois surge
É só deixar o bem entrar
E me faça contemplar na nova cidade que me corteja
Novas vitórias para celebrar.

Heróis de Papel

Atrás de seus bureaus acomodados
Sob folhas de papel e carimbos sem tinta
Meus heróis estão gordos e mofados
Escondendo entre os dentes
A palavra certa e o olhar aguçado

No aconchego do pão certo de cada dia
Na fala dissimulada do idioma rebuscado
Abrigam uma faísca do desejo de mudança
Como a semente que brotou no telhado

De onde virá a nova revolução
Se tudo parece já estar inventado
Se o capital impera e ordena o até fluxo
Dos desejos sinceros e do amor sonhado

Estão lá meus heróis
Com prisão de ventre e andar quebrado
Criando o que não queria
E o que queria, errado.

O sentido

Tateio a sorte com meus olhos
E os agüento chorosos.
Enquanto a sombra mina
A cidade de brinquedo
Em ruínas de templos e templários
Em demolição .
Já não quero mais o mesmo tédio.
Desejo o impossível do meu cérebro,
Transponho medos e traumas
Espalhados nos telhados.



Revejo a mesma dor composta em silêncio
Como a inventora dos meus segredos.
Caminho em silêncio a cidade deserta,
Como se meus pés devorassem a tristeza.
E se o vento flagelasse meu rosto surpreso.

Esbarro nas portas dos lupanares fechados
Resto de copos e corpos pelo chão,
Cálices vazios nos botecos,
Vidas vazias diante da televisão,
Sangue escorrendo nas palavras,
Gritos vermelhos nos ouvidos,
A violência crescendo entre a gente
e uma flor morrendo na minha mão...

Pequeno Sentimento

O amor que pensei ter vivido
Existiu de tudo até a morte
Foi assim à primeira vista
desgraçado
Declarado sob
A luz de estrelas cadentes
E dos pássaros negros
Riscando o céu nublado.

Só existiu em mim
Esse fogo brando
Agora em cinzas fumegantes
E como um suspiro de uma flor murchando
Trouxe consigo nos braços o limite

E ficaram costurados no vento
O meu desejo, tua repulsa
E a noção de que foi eterno
Aquelas faisquinhas de pequenos sentimentos.

A terra, de novo

Minha terra é minha insônia
Fervura de sonhos esquecidos
Cacos de vidros cheinhos de ternura
A talhar minha língua eternamente


Álbum multicolorido de despedidas e descaminhos
Choros engolidos de agruras ressequidas ao vento
Insistindo em vir à tona a qualquer segundo
O mural paupérrimo de mesquinhez enraizada
Do vil desejo de concatenar o que presumo
Reles gritos no meu texto insosso


Minha terra é meu revide

Minha resposta guardada dos portões que se cerraram ante os meu olhos
Como suprimir essa argila inquebrantável do meu paladar místico e vingativo
Da desforra essencialmente maravilhosa?
Como extinguir essa nódoa de vinho encravada na palidez de minha alma

Como destroçar essa coleira
Amálgama de dor e sabor de ventania
Ou enterrá-la aos poucos com a poeira cósmica do meu ócio
Ou revivê-la intensamente com a agudez meu verso em riste

Saudades, Camaragibe

Deixei por um tempo minha terra
E com saudade e rancor me despeço
Vou em busca de mim mesmo
Singrando caminhos que não conheço

Ando construindo o novo caminho
Com a saudade que tempera meu peito
Rasga meus olhos como cristais de gelo
E me aperta com os punhos os sonhos estreitos

Deixo por enquanto algumas lembranças
Bons amigos pra horas incautas
Nos bares, lares e ruas distantes

Minha alma segue em lágrimas enxutas
E impele meus átomos a serem perfeitos
Com a esperança na vida, no amor e na luta

terça-feira, 12 de fevereiro de 2008

O Valentão que furou a fila do banho da cacimba da Ilha de Itamaracá

Mas eu vi uma vez um buruçu
com um sujeito metido a valente
Desses que botam medo na gente
Da gente piscar com o cu

Era um dia de sol no litoral
E estavamos em pleno feriado
Todo mundo sujo e suado
Na Ilha de Itamaracá

Só tinha água mesmo salgada
Na torneira nem vento saía
Eu suado então fedia
E precisava de uma lavada

Fui onde tinha água na cidade
No morro perto do mangue
Tomei uma pra espalhar o sangue
E fui me fazer uma caridade

Segui então para o poço
de onde saía a água cristalina
Era menino e menina
Velha, velho e moço

Passei então pela vila
Subindo a ladeira no escuro
E seguindo então pelo muro
Tomei um susto com a fila

Ia de um quarteirão a outro
O tamanho daquilo tudo
Quase pensei no absurdo
De só tomar banho em agosto

Fiquei em pé então esperando
Com meu balde na mão conversando
Com os amigos também imundos
Mas a fila não estava andando

Foi então que vi o fato
Um sujeito gordo e alto
Sentado na frente da torneira
Tomando banho dessa maneira

Sem se importar com a gente
Pegava seu balde levantava
E de besta a gente ficava
Sem poder seguir pra frente

Foi então que veio a resposta
Dois magrinhos surgiram do nada
E insultaram o grandão que ficava
Sem ligar pra fila cansada

O fortão nem ligou, mas fez um aceno
Como que desprezando os pequenos
Que queriam seu banho tomar
E ali ficou sem nem ligar

Os rapazes começaram a bater
Foi tapa, tabefe e pezada
No sujeito que saiu rebocado
Correndo com um medo danado

Foi tanta porrada no indecente
Que deu dó mas saiu vaiado
Levou dois baques no rego, o coitado
E desapareceu no poente

Saiu todo nojento e melado
Tomando uma lição para sempre
Aprendeu a respeitar uma fila
E foi uma alegria na vila

Sendo aplaudidos, os caceteiros
É desses heróis brasileiros
Que faz que nosso país vibre
E né que eles eram de Camaragibe.

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008

Lista de Pedidos

Quero que o infinito me reserve

Toda sorte deste mundo

E dentro de minhas mãos caibam

Todos os sonhos do universo


E que do meu coração

Sempre saiam desejos profundos

Escorrendo, fluentes

Para a alma do meu verso


E nos olhos as paisagens mais belas

A natureza e a beleza dela

A música do paraíso, nos ouvidos,


No coração, o fogo das estrelas

Todo furor que possa ter perdido

Venha eu a receber nesta terra

domingo, 10 de fevereiro de 2008

Privacidade

Trancado no meu quarto
escuto um estrondo
São os olhos da noite
vigiando meus segredos
E paro de respirar
com medo e por sigilo
E choro em silêncio
sob as correntes do destino

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008

Poema

Inauguro um poema
como quem grita
E escrevo com as unhas
um texto insano sobre a lua

E do meu verso escapolem fadas
duendes e bruxas
Animando o meu coração solitário.