quinta-feira, 14 de fevereiro de 2008

Espera

Como quem espera a queda de cometas
Espero tua chegada ao meu mundo
Raio de orgulho partido
Olhar seco na neblina

Os segundos escorrem
Do firmamento
E minha garganta
Profere gritos silenciosos
E tu não chegas

Rezo, canto e praguejo
À paixão de areia que desmorona
Sobre minhas células ressentidas

Nunca mais ficarei ao relento
Suspirando a flor venenosa
Por três mil anos fui ferido
Com a lança doce do desejo

ARDIL

“De início quero ser navalha do próprio pescoço”
Aquecendo com o sangue o marasmo do tédio
Na noite insone e sem lua
Degustar
O desespero do vazio
Na certeza matemática
Da morte
E na efemeridade insignificante
Da vida

Quero ser poema
Sibilado no ouvido
Na hora do orgasmo
E do suplício de morte

Quero ser ágil
E com olhar ampliado
Senti a malícia salivando
Na boca sedenta das raposas
E ardilosamente
Planejar
O beijo assassino

Eu pirulito

A sensação de ser folha
De papel rosado
De um diário de menina
Com o coração zangado
A de ser pirulito de açúcar
Chupado, babado e fora jogado.

A de ser tapeado
Usado como virtual
Substituto
Para um namorico em crise.

Era de se imaginar
Aqueles beijos estalados
Que pareciam ensaiados
Aquele amasso dado em claro
(pra que todos vissem)

E eu bobo
Eu pirulito,
Indo no embalo.

Respondendo com beijo
O beijo dado,
Gostando, dançando
Abraçando empolgado
Já excitado.


Era cada beijo
Cada fungado
Eu pirulito
Chupado

Doce na essência
Coração melado
Também me exibindo
Também rebolado
Fingindo enganar
Quando enganado.

Hoje sem gosto,
Meio azedado,
Peito formigando,
Palito quebrado
Cônscio do uso
Sabendo-se usado.
Eu pirulito
Já descascado
A procurar outra boca
Que me queira lavado.

Súplica no morro

O olhar do morro nos enxergando
Como quem suplica e questiona
A dor de um menino que se menciona
Morreu de fome e chorando

Sua mãe solta um grito derramando
Toda angústia que aprisiona
Num eco vazio que não funciona
E o silêncio continua pairando

Mas há de um dia o universo
Convergir para um só processo
De igualdade e justiça de fato

Chega de leis sem cumprimento
Chega de lar sem alimento
E muita fartura em cada prato.

Setor de Frios

Meu coração peixe exposto na prateleira
Perecível e vulnerável, brinquedo perdido
No meio da rua
Sem preço, destino incerto no fim da festa
Feira de signos e maldições prediletas

Fica abandonado como quem espera
O que não há de vir
Iludido com as falsas faíscas
Resvaladas por engano nos olhos empoeirados
Secos pelo açoite cruel das horas impiedosas

Seguindo sombras de gaivotas negras
Sobre a água do rio poluído
O tempo passa cantando
E com o sangue acidificado
Passa na garganta o desejo resfriado
Pronto pra nascer novamente entre a lama
De areia movediça e a lava de um vulcão extinto

Sem saber que ele mesmo
É o prego e o dedo
Que reclama distraído
A felicidade sonhada que não enxerga

Eu e Guarabira

A nova cidade está aí disposta.
Desenrolada na estrada sóbria do porvir,
Indicando nova vida pra viver
E ser assim como que por acaso.

A vida está aí na frente
Com tudo que ela tem direito,
Com o vento e com as montanhas que te afagam de longe
E repercute no peito o arrepio.

Guarabira me recebe com o seu sorriso
E deseja que eu me transforme no que sou,
No homem que me sonhei quando menino

A vida me sorriu e o que eu posso é alegrar-me
E a cada dia sorrir com o presente
Do olhar do sol no horizonte.

A cidade está aí de frente,
Esperando-me,
Pra que eu cresças e mereça o que é meu.
Pra que eu floresça entre as flores secas e talentosas.

E cante no verso de cada estrada
Minha alegria mais sincera e estrondosa.
E escreva nas nuvens poemas curtos
E longas estórias de amores impossíveis.

E me realize com graça e rebeldia,
E não pare nunca de crescer e querer ser.
Ter beleza, saúde, riqueza e cultura.

Tudo se encaminha
Na altura de onde eu queira estar
Basta deixar ela me beijar
E que o resto depois surge
É só deixar o bem entrar
E me faça contemplar na nova cidade que me corteja
Novas vitórias para celebrar.

Heróis de Papel

Atrás de seus bureaus acomodados
Sob folhas de papel e carimbos sem tinta
Meus heróis estão gordos e mofados
Escondendo entre os dentes
A palavra certa e o olhar aguçado

No aconchego do pão certo de cada dia
Na fala dissimulada do idioma rebuscado
Abrigam uma faísca do desejo de mudança
Como a semente que brotou no telhado

De onde virá a nova revolução
Se tudo parece já estar inventado
Se o capital impera e ordena o até fluxo
Dos desejos sinceros e do amor sonhado

Estão lá meus heróis
Com prisão de ventre e andar quebrado
Criando o que não queria
E o que queria, errado.

O sentido

Tateio a sorte com meus olhos
E os agüento chorosos.
Enquanto a sombra mina
A cidade de brinquedo
Em ruínas de templos e templários
Em demolição .
Já não quero mais o mesmo tédio.
Desejo o impossível do meu cérebro,
Transponho medos e traumas
Espalhados nos telhados.



Revejo a mesma dor composta em silêncio
Como a inventora dos meus segredos.
Caminho em silêncio a cidade deserta,
Como se meus pés devorassem a tristeza.
E se o vento flagelasse meu rosto surpreso.

Esbarro nas portas dos lupanares fechados
Resto de copos e corpos pelo chão,
Cálices vazios nos botecos,
Vidas vazias diante da televisão,
Sangue escorrendo nas palavras,
Gritos vermelhos nos ouvidos,
A violência crescendo entre a gente
e uma flor morrendo na minha mão...

Pequeno Sentimento

O amor que pensei ter vivido
Existiu de tudo até a morte
Foi assim à primeira vista
desgraçado
Declarado sob
A luz de estrelas cadentes
E dos pássaros negros
Riscando o céu nublado.

Só existiu em mim
Esse fogo brando
Agora em cinzas fumegantes
E como um suspiro de uma flor murchando
Trouxe consigo nos braços o limite

E ficaram costurados no vento
O meu desejo, tua repulsa
E a noção de que foi eterno
Aquelas faisquinhas de pequenos sentimentos.

A terra, de novo

Minha terra é minha insônia
Fervura de sonhos esquecidos
Cacos de vidros cheinhos de ternura
A talhar minha língua eternamente


Álbum multicolorido de despedidas e descaminhos
Choros engolidos de agruras ressequidas ao vento
Insistindo em vir à tona a qualquer segundo
O mural paupérrimo de mesquinhez enraizada
Do vil desejo de concatenar o que presumo
Reles gritos no meu texto insosso


Minha terra é meu revide

Minha resposta guardada dos portões que se cerraram ante os meu olhos
Como suprimir essa argila inquebrantável do meu paladar místico e vingativo
Da desforra essencialmente maravilhosa?
Como extinguir essa nódoa de vinho encravada na palidez de minha alma

Como destroçar essa coleira
Amálgama de dor e sabor de ventania
Ou enterrá-la aos poucos com a poeira cósmica do meu ócio
Ou revivê-la intensamente com a agudez meu verso em riste

Saudades, Camaragibe

Deixei por um tempo minha terra
E com saudade e rancor me despeço
Vou em busca de mim mesmo
Singrando caminhos que não conheço

Ando construindo o novo caminho
Com a saudade que tempera meu peito
Rasga meus olhos como cristais de gelo
E me aperta com os punhos os sonhos estreitos

Deixo por enquanto algumas lembranças
Bons amigos pra horas incautas
Nos bares, lares e ruas distantes

Minha alma segue em lágrimas enxutas
E impele meus átomos a serem perfeitos
Com a esperança na vida, no amor e na luta

terça-feira, 12 de fevereiro de 2008

O Valentão que furou a fila do banho da cacimba da Ilha de Itamaracá

Mas eu vi uma vez um buruçu
com um sujeito metido a valente
Desses que botam medo na gente
Da gente piscar com o cu

Era um dia de sol no litoral
E estavamos em pleno feriado
Todo mundo sujo e suado
Na Ilha de Itamaracá

Só tinha água mesmo salgada
Na torneira nem vento saía
Eu suado então fedia
E precisava de uma lavada

Fui onde tinha água na cidade
No morro perto do mangue
Tomei uma pra espalhar o sangue
E fui me fazer uma caridade

Segui então para o poço
de onde saía a água cristalina
Era menino e menina
Velha, velho e moço

Passei então pela vila
Subindo a ladeira no escuro
E seguindo então pelo muro
Tomei um susto com a fila

Ia de um quarteirão a outro
O tamanho daquilo tudo
Quase pensei no absurdo
De só tomar banho em agosto

Fiquei em pé então esperando
Com meu balde na mão conversando
Com os amigos também imundos
Mas a fila não estava andando

Foi então que vi o fato
Um sujeito gordo e alto
Sentado na frente da torneira
Tomando banho dessa maneira

Sem se importar com a gente
Pegava seu balde levantava
E de besta a gente ficava
Sem poder seguir pra frente

Foi então que veio a resposta
Dois magrinhos surgiram do nada
E insultaram o grandão que ficava
Sem ligar pra fila cansada

O fortão nem ligou, mas fez um aceno
Como que desprezando os pequenos
Que queriam seu banho tomar
E ali ficou sem nem ligar

Os rapazes começaram a bater
Foi tapa, tabefe e pezada
No sujeito que saiu rebocado
Correndo com um medo danado

Foi tanta porrada no indecente
Que deu dó mas saiu vaiado
Levou dois baques no rego, o coitado
E desapareceu no poente

Saiu todo nojento e melado
Tomando uma lição para sempre
Aprendeu a respeitar uma fila
E foi uma alegria na vila

Sendo aplaudidos, os caceteiros
É desses heróis brasileiros
Que faz que nosso país vibre
E né que eles eram de Camaragibe.

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008

Lista de Pedidos

Quero que o infinito me reserve

Toda sorte deste mundo

E dentro de minhas mãos caibam

Todos os sonhos do universo


E que do meu coração

Sempre saiam desejos profundos

Escorrendo, fluentes

Para a alma do meu verso


E nos olhos as paisagens mais belas

A natureza e a beleza dela

A música do paraíso, nos ouvidos,


No coração, o fogo das estrelas

Todo furor que possa ter perdido

Venha eu a receber nesta terra

domingo, 10 de fevereiro de 2008

Privacidade

Trancado no meu quarto
escuto um estrondo
São os olhos da noite
vigiando meus segredos
E paro de respirar
com medo e por sigilo
E choro em silêncio
sob as correntes do destino

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008

Poema

Inauguro um poema
como quem grita
E escrevo com as unhas
um texto insano sobre a lua

E do meu verso escapolem fadas
duendes e bruxas
Animando o meu coração solitário.